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Gata, galinha, avião e melancia


“Havia em Alexandria uma mulher chamada Hipácia, filha do filósofo Teón, que fez tantas realizações em literatura e ciências que ultrapassou todos os filósofos da época...” (Sócrates, o escolástico, século V).
Hipácia, filósofa e mártir, única mulher a se destacar na antiguidade, foi à única mulher que ocupou a cadeira de Plotino na Academia de Atenas. Mas em uma tarde, durante a quaresma, é arrastada até a igreja de Cesário em Alexandria, e lá é despida e tem sua pele e carnes esfolados com conchas e cacos de cerâmica, e destroçada viva. Quando morta, arrancam seus membros e o restante do cadáver é queimado em uma pira.
Hipácia defendia a liberdade de religião e de pensamento, por ser Neoplatônica. Defendia que o Universo era regido por leis matemáticas, que bem mais tarde, na história, esta tese seria aprovada. Mas tais idéias suscitaram a ira de cristãos, em plena decadência do império Romano. E em 415, instigados por Cirilo, Bispo de Alexandria, assassinaram a filósofa. E sua morte selou, por mil anos, a estagnação da matemática ocidental, e Cirilo canonizado por Roma (e os assassinos se tornam santos).
Os espaços das mulheres tinham esferas diferentes no mundo antigo. No Egito faraônico, as mulheres tinham a possibilidade de se divorciar e manter parte de seus bens, tinham uma relativa liberdade. Apareciam como sacerdotisas e em alguns casos como regentes usando as vestes faraônicas, como Hatsheosut e no Egito ptolomaico, a famosa Cleópatra VII.
Hoje, nós vemos a opressão contra a mulher, muitas vezes tais opressões são tão sofisticadas que chegam a convencer que, esse é o caminho para a libertação feminina. O padrão machista de cultura associa erotismo à mercadoria. A isca é a imagem estereotipada da mulher. É verdadeiramente um açougue, onde se desfilam pernas, seios e nádegas, onde o corpo é violentamente modificado, modelado segundo padrões de beleza, onde se desloca sua autoestima, para sentirem-se desejadas. Segundo Frei Betto ...a mulher Hipácia é castrada em sua inteligência, e em seus talentos e valores subjetivos, e agora dilacerados pelas conveniências do mercado é sutilmente esfolada na ânsia de atingir a perfeição.
O amor virou demodê, pois acredito que toda mulher sabe que, é melhor ser amada, do que ser desejada. Um desejo por um corpo ideal não dura muito tempo, ainda mais com o passar dos anos. A gravidade insinua em cair sobre seu corpo. Mas a mulher virou em nossa sociedade objeto, onde elas mesmas se classificam assim, dando valor a atributos físicos, para serem desejadas, falam de emoções, desejos e nunca sobre valores; de fantasias e não de realidade; da vida privada e não da pública.
As mulheres têm um espaço público (não este espaço que a maioria dos homens fica a imaginar agora), elas têm a força da vida, a força política. Mas muitas preferem ser comparadas com sinônimos, gata, galinha, avião; ou ainda sendo comparada a frutas como melancia, jaca e melão. Onde se encontra o local da mulher em nossa sociedade? Em uma vitrine! Nas esquinas, para saciar a fome sexual de nós homens! Ou em um local onde verdadeiramente não devam ser comparadas com nós: machos. Sim, o local delas é serem veneradas, pela capacidade que toda mulher tem, a capacidade de gerar a vida.
Haverá uma época em que terá Botox para a alma, cirurgias plásticas para subjetividade. Ai sim, Hipácia será vingada.

Comentários

Lucas Diemer disse…
Muito interessante! Esse é um texto que mostra quão instável é a transição "passado-presente" que, em certo sentido, não existe oficialmente, mas apenas não é mencionada ou sua fina linha divisória não é visível para a maioria dos olhos comuns. A imagem estereotipada parece ser algo que nunca se dissipará e a sociedade vai caindo junto das instituições antigas que são suplantadas pelas "modernas". Ótimo texto, Gelson!
Rejina Leite disse…
A questão de genero é retrata muito bem aqui. A sociedade dita moderna, escraviza qualquer um com conceitos que todos devem seguir. E a maioria da população segue segamente estes conceitos, sem questionarar o que é verdadeiramente isso. AS mulheres, em sua maioria prefiram ser chamadas de gatas, aviões e até de frutas,invés de serem comparadas a uma Hipácia. Me envergonho em dizer, mas a realidade é essa, as mulheres de hoje, são como galinhas, tem que dar milho, para elas ciscarem em seu terreno e ponhar seus ovos.
Lucas e Rejina, agradeço pelo comentário. A imagem esteriotipada com certeza irá dominar muitos ainda. Em nossa sociedade, um corpo sarado, não tem um códice de saúde, pois sim, erótico, um poder imginável, um falsa sensação de poder, pois este se torna escravo do próprio corpo, e onde um escravo deste tipo tem algum poder?
Claudia da Rosa disse…
"Sim, o local delas é serem veneradas, pela capacidade que toda mulher tem, a capacidade de gerar a vida."

Muito bom o teu texto. Obrigada por nos defender.
:)
Obrigado Cláudia, nós homens temos um dever com as mulheres. Por elas que nós nascemos, por elas qeu nos alimentamos. e por elas que crescemos.

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