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Artigo: Os super-heróis das histórias em quadrinhos como recursos para promoção de resiliência em crianças e adolescentes em situação de risco

 

Para a maioria das pessoas, as histórias em quadrinhos de super-heróis se restringem apenas ao entretenimento do grande público, principalmente do público infanto-juvenil. Ao longo dos anos, tais personagens ultrapassaram as páginas das histórias em quadrinhos (hq’s) e invadiram o cinema, as séries de TV e outras animações. Segundo William Irwin, “um dos mais notáveis desenvolvimentos na cultura pop da atualidade é o forte ressurgimento do super-herói como ícone cultural e de entretenimento” (2005, p. 9). Entretanto, estas histórias em quadrinhos não são tão inocentes como aparentam, pois não trazem apenas  entretenimento ao leitor. Mais do que diversão, estas histórias introduzem e abordam de forma vivida algumas questões de suma importância enfrentadas no cotidiano de  pessoas “comuns”. São temas ligados à  superação de adversidades, construção de identidade pessoal, elementos de ética, moral, justiça, enfrentamento de medos, de situações de violência entre outras (WESCHENFELDER, 2011).



É inegável o crescente número de pessoas que vivem em condições desfavoráveis no Brasil e no mundo, independentemente de idade, geografia ou densidade populacional. Por isso, muitos profissionais da área da saúde, educação, psicologia e outras ciências afins vêm buscando estudar recursos e possibilidades de investimento em pesquisas que tragam conhecimento acerca de intervenções psicoeducaionais positivas. Segundo Yunes, Silveira, Juliano, Pietro & Garcia (2013) intervenções positivas buscam auxiliar e apoiar a procura da felicidade e do alivio de sintomas de depressão em nível de prevenção, ou seja, significam planejar e “intervir antes  que as patologias apareçam, quando o individuo, grupo, comunidade ainda estão sãos” (p. 231).

Um grupo em particular que merece a atenção de investigadores refere-se  às crianças e jovens que, pelas peculiaridades destas fases de desenvolvimento, podem apresentar comportamentos, estabelecer relações, padrões de conduta e rotinas que  (des)favorecer favorecem o desempenho do indivíduo na fase adulta (WINDLE et al, 2004; WORLD HEALTH ORGANATION, 2004). Reiterando essa preocupação no Brasil, o balanço mais recente do governo (janeiro a julho/2015), revelou o registro de 66.518 denúncias de violações de direitos humanos. Destas, 42.114 são relacionadas às violações dos direitos de crianças e adolescentes. Assim sendo, em 63,2% dos casos, os alvos das violações são as crianças e adolescentes que, sem sombra de dúvida, constituem um segmento fragilizado da população brasileira. Segundo o estudo da Secretaria, esses abusos registrados contra crianças e adolescentes estão mais concentrados em episódios de negligência (definida como a ausência ou ineficiência no cuidado) com 76,35%, seguida de violência psicológica com (47,76%,) violência física (42,66%)  e violência sexual (21,90%).  Estudos indicam que crianças que sofreram abandono ou negligência dos pais, abusos e outros tipos de violências e/ou privações apresentam taxas mais elevadas de comportamento desajustado na fase adulta do que seus pares não-desfavorecidos (COLE, 2014; JUFFER & VAN IJZENDOORN, 2005).

Ainda no que se refere a esse grupo, pesquisas internacionais comprovam taxas elevadas de: abuso de substâncias (HJERN, LIDBLAD & VINNERLJUNG, 2002), de relações sexuais desprotegidas (THOMPSON & AUSLANDER, 2011), de absentismo escolar (CRISTIAN, 2003), de auto-mutilação (VAN DER KOLK et al., 2009), e conduta anti-social (HJERN et al., 2002), entre outras condutas de risco. No que se refere a questões de ordem  psicológica, há evidências de taxas mais elevadas neste grupo que incluem: transtornos de conduta (SHIN, 2005), de déficit de atenção e hiperatividade - TDAH (LEHMANN, HAVIK, HAVIK, & HEIERVANG, 2013),  baixa auto-estima (LUKE & COYNE, 2008), e tentativas de suicídio (KEYES, MALONE, SHARMA, IACONO, & MCGUE, 2013). Sem a intervenção adequada, tais problemáticas poderão agravar-se ao longo da adolescência e depois na idade adulta.

Em resposta a isso, vários profissionais da área de saúde, educação e  psicologia buscam soluções para as ameaças à saúde mental de crianças e adolescentes em situação de risco. Nesse sentido, projetos de intervenção com foco na promoção de resiliência devem ser priorizados como possibilidades de prevenção.

 

Super heróis, entretenimento e a vida real

 

            O gênero super-aventura das histórias em quadrinhos foi criado em meados da década de 1930. Desde então, vem proporcionando entretenimento, aventura e emoção á jovens e adultos de todo mundo (JOHNSON, 2012). Originalmente aparecendo em quadrinhos, os personagens da Editora DC Comics, como Superman (1938), Batman (1939) e Capitão Marvel (1940), juntamente com a Editora Marvel Comics, Capitão América (1940), Hulk (1962), Homem-Aranha (1962), e Homem de Ferro (1963) proporcionam aventura sobrenatural para várias gerações de crianças e jovens. Com o advento do cinema, alguns super heróis das histórias em quadrinhos foram adaptados para a tela, ganhando grande destaque principalmente nas bilheterias com as super-produções, e criando um novo gênero cinematográfico. Os super heróis ganharam novos holofotes e tornaram-se grandes destaques da cultura pop mundial.

Por outro lado, na “vida real’ o confronto com situações de risco faz parte do dia a dia de grande parcela da população brasileira e mundial. Adversidades são eventos ou circunstâncias que podem ter um impacto negativo muitas vezes imensurável sobre os indivíduos (Schmidt, 2003). Pesquisadores tratam dessa dimensão como fatores ou mecanismos de risco (RUTTER, 1987). Para a criança em situação de risco, as dificuldades podem se expressar em contextos proximais por vivências de: abuso físico ou sexual, abandono da família, bullying, ou negligência física e/ou emocional. No macrocontexto as situações de risco incluem a escassez de recursos (financeiros, educacionais, emocionais, sociais) e de redes de apoio e proteção (Juliano & Yunes, 2014) que podem, direta ou indiretamente ameaçar a segurança e o bem-estar da criança e de suas famílias. Além disso, estudos clássicos demostram que o acúmulo de adversidades (mas não a presença de um único fator de adversidade ou de risco), está associado a taxas mais elevadas de comportamento desajustado e dificuldades psicossociais na infância (RUTTER 1979). Conforme já ressaltado, os resultados destas condições se expressam por taxas mais elevadas de sexo desprotegido, abuso de drogas, evasão escolar, e agressão em crianças que vivem em desvantagem socioeconômica, quando comparadas aos seus pares mais socialmente favorecidos (LEHMANN et al, 2013;. REISS, 2013; SHIN, 2005; THOMPSON & AUSLANDER, 2011).

 

Exemplos de Programas e Estratégias de intervenções psicoeducacionais

 

            Nos EUA, um programa de tutoria vem mostrando resultados significativos e intitula-se “Big Brother/Big Sister”. Este é um programa que atua em todos os 50 estados norte-americanos e foi fundado em 1904 para dar suporte a meninos e meninas de baixa renda, de idades entre 6 e 18 anos de idade. O programa de tutoria em questão,  tem mostrados resultados positivos em termos de melhorias do desempenho acadêmico e redução de evasão escolar (TIERNEY, GROSSMAN, RESCH, 1995) bem como na redução da ansiedade social e melhorias em habilidade sociais (DE WIT, et al., 2007).

            Outro programa social em solo norte-americano é o “Head Star”, um programa do Ministério da Saúde, Educação e Assistência Social, que oferece educação e outros serviços abrangentes de saúde e nutrição e que envolvem crianças de baixa renda e suas famílias. Este programa foi criado em 1965, e sempre manteve como objetivo erradicar a pobreza sistêmica nos Estados Unidos. É uma proposta fundamental para a qualidade da educação pré-escolar para muitos meninos e meninas nos EUA (ZIGLER & VALENTINE, 1979). Desde meados da década de 1960, os resultados obtidos demonstram a eficácia das intervenções “positivas” através das avaliações (MCGRODER, 1990; US Department of Health and Human Services. [USDHHS], 2005; USDHHS, U.S. Administration for Children and Families, 2010; Westinghouse Learning Corporation, 1969).

            Ambos os programas, “Big Brother/Big Sister” e “Head Star” são destinados a promover desenvolvimento de competências, habilidades sociais, bem como de estratégias de enfrentamento para compensar as adversidades sofridas durante a infância. Os resultados das avaliações destas intervenções demostram que entre as meninas em situação de risco, os programas de educação sexual têm demonstrado sucesso no aumento do uso do preservativo e redução do número de parceiros sexuais (DAVIDSON & PHEBUS, 2013), bem como no atraso da segunda gravidez entre as mães adolescentes (SANGALANG, BARTH, & PAINTER, 2006; SOLOMON & LIEFELD, 1998).

No Brasil, as maiores mudanças nas concepções sobre atendimento e proteção à infância e adolescência vieram a partir da criação do Estatuto da Criança e do Adolescente, 1990 (ECA, BRASIL, 1990, Lei Federal n. 8.069/90) e seus desdobramentos através de outras leis tais quais  a Lei Orgânica da Saúde (LOS), a criação do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente – Conanda (Lei Federal n. 8.242/91) e de Assistencia Social; Loas (Lei Federal n. 8.742/93), entre outras (Perez & Passone, 2010). Sabe-se ainda da existência de alguns Programas Nacionais, com destaque para o Estratégia Saúde da Família (ESF)  e o Bolsa Família que  buscam promover o acesso à rede de serviços públicos, em especial, de saúde, educação e assistência social e de alguma forma buscam combater a pobreza e desigualdade social. Entretanto, é urgente o desenvolvimento das políticas sociais de atendimento infanto-juvenil  com vistas ao desenvolvimento  e efetiva implementação de Programas de proteção à infância e à adolescência em seus diferentes contextos.

 

Super heróis e proteção ao desenvolvimento na infância e adolescência: uma relação possível?

 

            Os pacientes de uma oncologia pediátrica de um hospital no Brasil, o Hospital A. C. Camargo Center em São Paulo, ganharam um super ajuda no tratamento do câncer infantil, ou melhor dizendo, ganharam uma “Super-Fórmula”.

Na tentativa de reforçar a esperança das crianças e alimentar a sua vontade de lutar contra o câncer (WILSON, 2013), a ala da oncologia pediátrica do hospital A. C. Camargo Center foi transformada em a ‘Sala da Justiça’, alusão ao local da equipe de super heróis nas histórias em quadrinhos publicadas e promovidas pela DC Comics. Heróis como ‘Batman’, ‘Aquaman’, ‘Mulher Maravilha’, ‘Lanterna Verde’, entre outros da ‘Liga da Justiça’ fazem muito sucesso e são amplamente aceitos entre as crianças. A ala hospitalar foi toda redecorada: a sala de brinquedos se transformou em Sala da Justiça e as portas e corredores foram adesivados com a fachada apresentando uma entrada exclusiva para os pequenos heróis (A.C. CAMARGO CENTER, 2014).

            Este é um exemplo do projeto lançado em 2013, que contempla diversas ações, criadas pela agência JWT que têm como objetivo, dar mais leveza ao tratamento ao câncer infantil. Não foi somente a ambientação dos espaços que foi modificada, mas os recipientes usados na quimioterapia, que foram remodelados e ganharam uma nova roupagem, envoltos por cápsulas baseadas nos logos dos uniformes dos super heróis.

 

Para ampliar a eficácia da ação, a JWT, Warner Bros., Vetor Zero e os médicos da Pediatria do A.C.Camargo trabalham juntos na criação e produção de uma série especial de desenhos animados e gibis, onde os próprios heróis vivem uma história semelhante à da criança com câncer e se recuperam através dessa Superfórmula. "O tratamento, principalmente no começo, é muito assustador tanto para a criança quanto para a família. O projeto Superfórmula ajuda no entendimento da doença e desperta nas crianças e adolescentes ainda mais forças para enfrentar a dor e superar os problemas ao longo do tratamento para, ao final, ficar bem. Os pacientes são os verdadeiros super-heróis, e seu poder é acreditar na cura", afirmou Cecília Lima da Costa, diretora de Oncologia Pediátrica do A.C.Camargo (A. C. CAMARGO, 2014).

 

            Poder-se-ia afirmar que usar os super-heróis neste projeto tem como objetivo implícito,  “promover expressões de resiliência” nas crianças que sofrem com a doença, trazendo os personagens como modelos de enfrentamento vitorioso da dor e do sofrimento. O uso dos super heróis nos medicamentos, traça paralelos entre as batalhas dos personagens contra o mal e a batalha da própria criança contra o câncer. Esta abordagem aplica de forma positiva, a sugestão ou a ideia de “invencibilidade”, na medida em que a criança pode se inspirar no modelo do super herói e na sua super-potência. O resultado passa a ser o empoderamento psicológico desta criança, conforme alguns relatos evidennciaram. Dessa maneira, ‘convence’ a criança que,  assim como o super herói, ela/ele, também tem poderes para enfrentar qualquer desafio, assim como a batalha contra sua doença.

 

O que é resiliência?

 

Muitos estudos teóricos e metodológicos vêm sendo publicados ao longo de pouco mais de 30 anos sobre o conceito de resiliência na perspectiva de fenômeno humano. Entretanto, o construto e suas definições ainda permanecem desafiadores para os cientistas sociais contemporâneos. Apesar das controvérsias, há relativo consenso quanto ao fato de que resiliência refere-se a um conjunto de processos de vida que possibilitam o enfrentamento de situações de sofrimento com consequente fortalecimento, transformação pessoal/coletiva/cultural e superação das adversidades (YUNES, 2015). Entretanto, isso não significa afirmar que pessoas ou grupos passam por sofrimentos de forma passiva e inabalável, como sugeriam os termos precursores:  invulnerabilidade ou invencibilidade (ANTHONY & COHLER, 1987). Ao contrário, uma das mais relevantes contribuições dos trabalhos sobre resiliência é a de “trazer luz às metamorfoses pessoais e sociais que resultam em vida saudável e acima das expectativas em situações de extrema adversidade” (YUNES, 2015).

Inicialmente, as pesquisas sobre resiliência focavam predominantemente o indivíduo e postulavam convencionalmente a resiliência como algo “a priori”, tais como, capacidades, traços ou disposições individuais diante de situações de adversidades.  Paralelamente, foram surgindo novas concepções de resiliência como processo e sistema de adaptação (MASTEN, 2001; Rutter, 2008; LUTHAR, YUNES, 2007, entre outros) às circunstâncias da vida. Outros pesquisadores passaram a dar mais ênfase para o estudo destes processos e percepções de resiliência analisados através de elementos qualitativos de experiências de vida e compreendidos sob a ótica sistêmica com foco na unidade familiar e parental (RODRIGO & MAIQUEZ, 2007; RODRIGO, MAIQUEZ, MARTIN & BYRNE, 2008; RODRIGO, 2009; WALSH, 2005).Importante ressaltar que as complexidades do fenômeno e as dificuldades conceituais (MARTINEAU, 1999; UNGAR, 2004a, 2004b, 2004c; UNGAR et al., 2007; YUNES, 2003, 2007 entre outros) ou metodológicas  e de aplicabilidade do termo vêm sendo apontadas por muitos pesquisadores que questionam as formas de adjetivação  e opõe-se fortemente à quantificação dos "mais/muito resilientes" e "menos/pouco resilientes" (YUNES, 2007). Entretanto, fica clara a necessidade de investigar e sopesar a interação entre condições de risco e de proteção que tem como resultado expressões ou manifestações de resiliência. 

No caso das crianças em situações de risco ou desfavorecidas social e economicamente, os estresses e adversidades podem vir na forma de: ausência parental ou de cuidadores, abuso intra ou extra familiar (sexual, emocional, físico), escassez de recursos materiais e sociais (pobreza e privação social), e o bullying na escola ou fora da escola, para citar alguns. Dentro desse grupo, a construção  de elementos de resiliência pode assumir a forma de: promoção de relações positivas; apoio interpessoal; interações significativas; ordem, rotina, supervisão e disciplina; e tarefa de conclusão; todos os fatores associados à capacidade positiva de lidar com o estresse e adversidade (MASTEN, 1994; NETTLES & PLECK, 1993; RUTTER, 1987; ZHANG, DEBLOIS, DENIGER, & KAMANZI, 2008).

Portanto, apesar de resiliência já ter sido considerada a manifestação de um traço ou atributo do indivíduo, atualmente é considerada como um ou mais processos (RUTTER, 2008) que se expressam em diferentes contextos e ambientes por uma multiplicidade de formas. Alguns cientistas enfatizam a noção de capital social e seu papel dentro do processo (por exemplo, ZHANG et al., 2008), usando termos como “tutores de resiliência” (CYRULNIK, 200..).Outros enfatizam a noção de ambientes interativos, todos afetando e afetados uns pelos outros (BROFENBRENNER, 1979; SHAND, 2014).

 

Super Heróis e o paralelo com a vida real

 

O termo crianças em situações de risco vem sendo aplicado a crianças e adolescentes que vivem em situação de pobreza e / ou sofrendo privação, negligência e / ou abuso. Para efeitos deste artigo, o termo também inclui crianças órfãs e vulneráveis (COV) de todas as faixas socioeconômicas, que sofrem  desde estágios prematuros na infância, a ausência de amor, proteção, apoio e orientação dos adultos significativos (pais ou responsáveis, cuidadores, professores, etc|),. Sabe-se que as crianças em situações de risco apresentam maiores probabilidades de problemas comportamentais e psicossociais (JUFFER & VAN IJZENDOORN, 2005; LEHRMANN et al, 2013;. REISS, 2013; SHIN, 2005). Assim, este artigo busca investigar a relação entre as adversidades vividas por este grupo de risco e as histórias de vida ficcional dos super heróis dos quadrinhos com suas adaptações para o cinema. A hipótese a ser pesquisada é de que há semelhanças a serem descobertas entre a vida dos super heróis e a vida real de crianças e jovens que experienciam diferentes situações de risco. Tais similitudes, podem ser de grande valor como recurso para os programas de educação ligados a área de saúde, ensino, assistência social e planejamento de políticas públicas.

Conforme demonstrado anteriormente na sessão anterior, a área da saúde já vem usando estas concepções para trabalhar com certas populações de crianças em situação de fragilidade física e emocional e emprega o símbolo dos super heróis como uma ferramenta de empoderamento para incentivar o enfrentamento do sofrimento causado por doenças graves. De uma certa forma, isso demonstra que os personagens são projetados como modelos de superação, e as crianças inspiram-se nos mesmos para superar suas doenças (WILSON, 2013; A. C. CAMARGO, 2014).

A literatura científica não apresenta pesquisas a respeito dos dados acima relacionados. Tampouco consta na literatura científica que tenham sido examinados os paralelos entre as adversidades da vida real de crianças e jovens desfavorecidos (por exemplo, abandono, abuso e etc.), e as histórias de vida ficcionais vividas pelos super-heróis, especialmente no estágio anterior à transformação desses personagens heróicoscuja transformação representadas por suas ‘capas e máscaras’ transparecem ser o sinal de força para combater o crime e o mal.  Tal fato leva a questionar quais seriam as implicações clínicas, sociais e educacionais dessas semelhanças para a construção de programas de apoio e educação social em diferentes ambientes educativos.

 

 

O estágio ‘Pré-Capa/ Pre-Máscara’ dos super heróis

 

            Nessta sessão, será realizada uma análise da fase da vida dos personagens super heróicos antes de vestirem suas fantasias e capas, ou seja, antes de se tornarem os  super heróis como são conhecidos. As expressões “Pre-Cloak”/Pre-Mask  ou “Pré-Capa/Pré-Máscara”, na tradução literal, foi criada pelos autores deste texto para fazer referencia a este período da vida do personagem ficcional super heróico. Isso quer dizer que, como todos os indivíduos na vida real, os super heróis apresentam momentos de desenvolvimento na sua vida ficcional, durante os quais eles (as) não desempenhavam funções heroicas. Este estágio foi objeto de análise desse momento do artigo.

            Como destacado anteriormente, não há estudos sobre a relação da vida ficcional dos super heróis e as reais adversidades sofridas por crianças e adolescentes. Pouco se enfatiza sobre esta fase que antecede os acontecimentos e feitos super heroicos e que podem revelar uma vida complicada  experienciada por estes personagens. No entanto, pode-se encontrar dados que são referidos pela literatura de vários campos do conhecimento.

            O que foi determinado como a fase “Pre-Cloak/Pre-Mask”, se refere ao estágio de desenvolvimento do personagem antes da sua estreia como um super herói fantasiado. Em muitos personagens, é nessa fase que acontece algo que faz futuramente com que eles se transformem, dando um salto de positividade no seu desenvolvimento pessoal. Em muitas histórias, os personagens sofreram alguma adversidade, seja na infância ou juventude. E, de acordo com o desenrolar das histórias,  essas adversidades parecem fazer com que estes personagens se desenvolvam diferentemente após o trauma sofrido. Neste aspecto, Boris Cyrulnik afirma que:

 

O trauma torna-se então um novo organizador do eu em torno do qual os esforços e os sonhos constroem uma curiosa mentalidade. O desenvolvimento já não é normal, pois houve uma catástrofe. Por vezes, a personalidade se orienta para uma psicopatia ou uma depressão recidiva. Mas muitas vezes nota-se um neodesenvolvimento que contém, na alma, a fúria de contas a acertar e uma fascinação pelos acontecimentos que evocam a ferida passada. Nota-se o surgimento de um estranho valor, uma coragem mordida que dá sentido ao sofrimento e o transcende, tamanha a necessidade de o ferido pensar em dias melhores (2009, p. 34).

           

 

            Esta dimensão teórica leva a considerar que o personagem super herói pode ser um modelo de resiliência,  pois ele se transforma e torna-se habilidoso  para superar as suas adversidades, transcendendo-as. Esse processo é fundamental para a construção e desenvolvimento dos personagens. Joseph Campbell (2008), refere-se a estes momentos  como iniciação enquanto Michel Rutter faz referência ao “ponto de virada” (1987). Independentemente de nomenclaturas, há um momento  que é monumental para os super heróis das histórias em quadrinhos e também pode vir a ser para a criança em situação de risco, podendo assim, tornar-se um marco de desenvolvimento.

            Para ilustrar a análise realizada, foi criada uma tabela (Tabela 1), para demonstrar que algumas adversidades ocorreram na vida ficcional denominada “Pré-Cloak” dos personagens. Para efeitos deste artigo, uma indexação detalhada de super-heróis foi conduzida. No processo de sistematização dos dados, foram computados os super-heróis mais relevantes, em termos de visibilidade da cultura pop, de popularidade, e de “resistência” ao longo do tempo. A partir das editoras DC / Marvel, uma amostra dos 20 super heróis mais influentes foi derivada. Para tal, os ganhos financeiros de bilheteria dos filmes foram utilizados como  parâmetro de influência. Conforme apresentado na tabela abaixo, esta amostra fornece a base para o corpo deste artigo.

 

            Tabela 1

Demografia dos super heróis

             

 

 

 

 

       Filmes lançados

Personagem

Adversidade (Idade)

Surgimento

Editora

Filmes

Ano

Faturamento (U$)*

 

 

 

 

 

 

 

 

Homem Aranha

Órfão (6)

1962

Marvel

5

2002-2014

 

$3,640,124,460

Tio assassinado (15)

Bullying (6)

Limitações econômicas (6)

Batman

Órfão (11)

1939

DC

7

1989-2012

$3,640,124,460

Família assassinada (11)

Homem de Ferro

Órfão (21)

1963

Marvel

4

2008-2013

$2,679,317,397

Pai assassinado (21)

Seqüestrado (23)

Superman

Órfão (0)

1938

DC

6

1978-2013

$1,543,162,077

Abandonado (0)

Amigo ferido (15)

Capitão América

Bullying (6)

1941

Marvel

3

2011-2014

$1,339,423,196

Infância frágil e doente (0)

Limitações econômicas(0)

Thor

Exilado (17)

1962

Marvel

3

2011-2013

$1,119,586,743

Memória apagada (17)

Wolverine

Órfão(8)

1974

Marvel

7

2000-2014

$1,037,418,854

Pais assassinados(8)

Usado como cobaia em experimento (~25)

Amnésia (~25)

Hulk

Abandonado (8)

1962

Marvel

3

2003-2012

$763,557,890

Mãe assassinada(8)

Acidente com radiação em laboratório(26)

Motoqueiro Fantasma

Órfão(13)

1972

Marvel

2

2008-2012

$361,302,323

Fez pacto com o diabo (15)

Charles Xavier

Pai assassinado(5)

1963

Marvel

5

2000-2014

$308,485,098

Mãe estuprada pelo padrasto(9)

Paralítico (25)

Viúva Negra

Abandonada (3)

1964

Marvel

3

2010-2014

$302,375,422

Gavião Arqueiro

Pais assassinados(8)

1964

Marvel

2

2011-2012

$254,769,850

Órfão (8)

Green Lantern

Órfão (8)

1940

DC

1

2011

$219,851,172

Demolidor

Órfão (18)

1964

Marvel

1

2003

$179,179,718

Cegueira(11)

Mercúrio

Órfão (0)

1964

Marvel

1

2007

$106,577,957

Abandonado (1)

Fugitivo (17)

Mulher Gato

Órfão (2)

1940

DC

1

2004

$82,102,379

Ladra(10)

Justiceiro

Família assassinada(30)

1974

Marvel

2

2004-2008

$64,800,141

Surfista Prateado

Órfão(14)

1966

Marvel

1

2007

$57,809,553

Fugitivo (18)

Falcão

Família assassinada (19) Criminoso(20)

1969

Marvel

1

2014

$47,605,572

Rorschach

Abandonado (0)

1986

DC

1

2009

$30,876,497

Bullying(6)

Mãe: prostituta (0)

* Faturamento (US$), ganhos brutos mundiais em US$ incluindo ganhos proporcionais dos seguintes filmes conjuntos de Super Heróis, divididos entre os principais personagens: X-Men (2000), X-Men 2 (2003), X-Men: O Confronto Final (2006) , Quarteto Fantástico e o Surfista Prateado (2007), Watchmen (2009), Homem de Ferro 2 (2010), Thor (2011), X-Men: First Class (2011), Vingadores (2012), X-Men: Dias de Future Esquecido (2014), Capitão América: O Soldado Invernal (2014).

 

A Tabela 1 acima,  demosntra que os super heróis viveram adversidades na fase de “Pré-Cloak/Pre-Mask” de suas vidas. Esses estressores incluem experiências negativas do tipo: orfandade (Homem-Aranha, Superman, Batman), o abandono pela família (Hulk, Superman, Viúva Negra), o assassinato de parentes (Homem-Aranha, Batman), limitações econômicas (Capitão América, Homem-Aranha), seqüestro (Homem de Ferro) e Bullying (Homem-Aranha, Capitão América), para citar apenas alguns. Portanto, a análise da referida tabela evidencia que muitos dos super heróis foram submetidos a múltiplas adversidades   que traduzem as lutas e o sofrimento que muitos adolescentes e crianças enfrentam (RUTTER, 1979).

 

Análise das adversidades vividas por super heróis na fase “Pré- Cloak”

 

Com base na amostra de 20 super heróis que além de circularem em diferentes meios de comunicação, foram adaptados para o cinema e estão incluídos na Tabela 1, foram calculadas as prevalências de adversidadesvividas por estes personagens. Como não havia uma ampla gama de variabilidade na influência entre a amostra (com influência aproximada por ganhos brutos das bilheterias), a ponderação foi empregada para os cálculos. A Figura 1 apresenta essas prevalências ponderadas das adversidades na infância entre os 20 super heróis citados na Tabela 1, antes de sua fase “Pré-Cloak.

A Figura 1 abaixo demonstra que, dos 20 super heróis apresentados na Tabela 1, 80% são órfãos; 86% já eram órfãos ou foram abandonados; 49% teve pelo menos um dos pais assassinados; 15% foram seqüestrados; 29% sofreram bullying; e 29% sofreram com pobreza ou limitações socioeconômicas. Foram detectadas ainda adversidades isoladas tais quais: ser portador de deficiências como cegueira (1%), ser cobaia humana em experiências científicas (6%), ter a mãe estuprada pelo padrasto (1%), e atividade no crime (2%). Além dessas adversidades isoladas serem consideráveis e agravantes, deve-se ressaltar o estresse cumulativo de múltiplas adversidades já referido anteriormente (Rutter, 1979; Masten, 2014) que ocorreu com freqüência entre os 20 super heróis examinados (por exemplo, Homem-Aranha, Batman, Homem de Ferro). Isso quer dizer que os personagens sofriam não apenas com uma situação de risco, mas com mais de uma ao mesmo tempo.

A natureza das adversidades dos super heróis na fase “Pré-Cloak/ Pre-Mask” apresentados na Tabela 1 e Figura 1 compartilham uma afinidade com um subgrupo de crianças desfavorecidas socialmente e em situação de risco que são: as crianças órfãs e abandonadas.

 

Figura 1


Dentro desse subgrupo pode-se encontrar diversas variações que, no entanto acabam levando crianças e adolescentes para situação de institucionalização ou acolhimento e suas consequências no desenvolvimento.

No contexto deste trabalho, a categoria de crianças institucionalizadas se refere a crianças que vivem em instituições de acolhimento, separadas de seus responsáveis. Estas crianças e adolescentes, freqüentemente já experimentaram o abandono, e/ou em muitos casos a perda de um responsável legal (TAUSSIG, 2002). Além disso, muitos são colocados em instituições devido a constatações de abusos ou negligências por parte de seu responsável. Algumas vezes, estas experiências resultam em problemas comportamentais e psicossociais (CICCHETTI & LYNCH, 1993).

Em um estudo brasileiro sobre a saúde psicossocial de crianças institucionalizadas, os autores encontraram uma maior freqüência de eventos de vida negativos relatados pelas crianças institucionalizadas do que pelos seus pares não institucionalizados (WATHIER & DELL'AGLIO, 2007). Os autores também descobriram que esses eventos negativos associados aos escores significativamente mais elevados nos Inventário de Depressão Infantil entre as crianças institucionalizadas, sugeriu que este grupo é mais vulnerável à depressão do que os seus pares não institucionalizados. Estas descobertas são significativas na amostra como um todo, e para os quatro subgrupos com base no gênero (m, f), e idade (7-11, 12-17).

Na literatura, a categoria de Crianças Órfãs e Vulneráveis descreve crianças como por exemplo na África sub-saariana, órfãs devido à epidemia da AIDS (SKINNER et al., 2004). Além da perda dos pais, muitas destas crianças são vítimas da "pobreza, da fome, da falta de acesso aos serviços, roupa ou abrigo inadequada, superlotação, responsáveis deficientes" (SKINNER et al., 2006, p. 619). Além disso, muitos também são vítimas da "deficiência, da experiência direta de violência física ou sexual, ou doenças crônicas graves" (SKINNER et al., 2006, p. 619).

Órfão segundo a definição do dicionário português, é aquele que perdeu os pais ou um deles; o que perdeu um protetor, ou quem lhe era querido (MICHAELIS, 2014).  Segundo a UNICEF (2004)  órfão  é definido  como indivíduo  menor  de  18  anos  que  a  mãe ou  o  pai  (ou  ambos) morreram.

Há discussões amplas a respeito da definição de orfandade, segundo Ferrara (2009), que vem reafirmar que, órfãos são menores de 18 anos que perderam um ou ambos os pais biológicos, que são vistas pelos órgãos internacionais como, inevitalmente, sem lar ou família e susceptíveis a comportamentos anti-sociais e criminais. Mas, “ao contrário dos esterioótipos que circulam sobre as implicações da orfandade para crianças, a maioria dessas não vive sem a presença de um adulto, sem cuidado, suporte, supervisão ou socialização (MEINTJES e GIESSE, 2006 aput FERRARA, 2009). Entretanto, para os autores desse texto, a orfandade transcende a presença ou não de cuidadores, mas vincula-se mais a presença ou não de elementos de proteção para uma infância  e adolescência  saudável com os recursos materiais e psicológicos necessários.

O argumento que se busca neste dialogo com a ficção é que a natureza das adversidades dos personagens heroicos no estágio de vida “Pré-Cloak/ Pre-Mask” apresentados na Tabela 1 e na Figura 1 parecem estas altamente sintonicos com aquelas experimentadas por crianças e adolescente em situação de acolhimento por serem órfãos, abandonados ou abusados de alguma maneira em seus direitos fundamentais que no Brasil são expressamente reconhecidos pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (Brasil, 1990). Este paralelo demonstra haver consistências nas possibilidades de  respostas ás nossas reflexões e que apresentamos a seguir:

 

1. No que diz respeito a paralelos entre adversidades vivenciadas por crianças em situações de risco (por exemplo, abandono, negligência, abuso psicológico, físico ou sexual) e as adversidades vividas por personagens ficcionais como os super heróis no “Pré-Cloak” exemplificados por abandono, perdas, violências), nossos resultados sugerem que  há um paralelo. No entanto, é uma condição que que pode se aplicar mais fortemente para o subgrupo de crianças carentes por orfandade ou abandono das famílias.

 

2. Em relação à sobreposição entre as adversidades vividas por crianças desfavorecidas e as adversidades vividas pelos super heróis na fase de desenvolvimento denominada por nós, autores como“Pré-Cloak/Pre- Mask’, os nossos resultados sugerem que condicionalmente esta sobreposição existe. É condicional posto que a sobreposição mais pronunciada nas adversidades estaria entre o subgrupo de crianças carentes que são órfãs ou abandonadas por suas famílias.

 

3. O que as relações acima podem significar? Estes resultados sugerem que existem adversidades compartilhadas entre certos subgrupos de crianças desfavorecidas e super heróis no estágio “Pré-Cloak/ Pre-mask”. E ao que tudo indica, esse é um recurso ainda inexplorado por muitas áreas de conhecimento.

 

Implicações

O referido recurso ainda não explorado sobre as interfaces das adversidades comuns entre certos subgrupos de crianças em situações de acolhimento ou outros riscos psicossociais e os super heróis no estágio “Pré-Cloak/Pre-Mask’ parece apresentar potencial para capacitação e construção de expressões de resiliência. Para os clínicos que trabalham com crianças órfãs, abandonadas, deprovidas de atenção psicossocial, a história comum que existe entre Homem-Aranha e a vida da criança sob este risco, pode ser usada para informar à criança que ele ou ela não são únicos e não são tão somente vítimas, o que pode aumentar o capital social. Por exemplo, o personagem Homem Aranha lutou com os mesmos problemas de muitas crianças que vivem em instituições de acolhimento (ausência dos pais, bullying). Para essa criança, esse conhecimento pode reduzir a sensação de isolamento e impotência, e criar um sentido de terreno comum, associado ainda a um sentimento de fazer parte de uma comunidade de “fortes” e “vencedores”. Os personagens das histórias em quadrinhos podem assim, vir a ser modelos inspiradores de superação e resiliência.

Para os educadores, o conhecimento da história comum que existe entre os super heróis e as crianças menos favorecidas socialmente, podem ser tecidas em lições para informar e criar um diálogo sobre a diversidade, tolerância e fraternidade. Para um estudante em situação não-desfavorecida ser lembrado sobre as adversidades enfrentadas pelos super heróis, e as semelhanças entre as dos colegas em estado de risco, pode plantar as sementes de empatia e tolerância, e na melhor das hipóteses, reduzir episódios de bullying no ambiente escolar.

 

Contextos de aplicação da ideia ‘Pré-Cloak/Pre-Mask’

 

É necessário prosseguir com estudos empíricos para quantificar e qualificar o potencial desses achados de adversidades comuns entre crianças desfavorecidas socialmente e os super heróis em seu estágio “Pré-Cloak/´Pre-Mask”. O objetivo de tal estudo, além de quantificar o potencial das descobertas neste trabalho, seria estudar um cenário de base interventiva para a construção de resiliência entre este grupo de risco.

Para o clínico ou cuidador profissional, promoção de resiliência pode significar o momento de empoderamento na vida dos super heróis. Como visto na Figura 2, logo abaixo, este momento marca o fim da fase  “Pré-Cloak” (pré-capa), ou seja, conforme a metáfora usada por Campbell, seria o estágio no qual o profissional passa/oferece simbolicamente a “capa” para a criança ou adolescente e facilita para que ele/ela “voe” pelos caminhos de sua própria vida com seus planos futuros (CAMPBELL, 2012). Para Superman, este é o momento em que Clark Kent veste seu traje e sua capa, e emerge da cabine telefônica super-empoderado. Para a borboleta, este é o momento em que sai da crisálida, abre suas asas e voa pela primeira vez. No mundo de seres humanos, sabe-se que estes momentos são relacionais ou seja, é importante a presença de um outro significativo que neste caso pode ser um profissional (YUNES et al, 2013)

 

Considerações Finais

 

            Possibilitar que crianças e adolescentes em situações de risco psicossocial tenham oportunidades justas de desenvolvimento é a meta que desejamos alcançar. É importante que pesquisadores, profissionais da área da saúde, pais, educadores, etc. se esforcem para dar a todas as crianças uma oportunidade justa de desenvolvimento saudável. Porém, os recursos sociais na maioria das vezes não são ofertados de forma justa. Algumas crianças crescem em famílias estáveis e amorosas; enquanto há outras, que nunca puderam sentiram a presença de alguém que, como diria Bronfenbrenner, seja “louco por ela” (BRONFEBRENNER, 1991). Para pesquisadores da área de saúde e da educação, estas crianças podem estar em condições de risco, pelo “simples” fato de não terem pessoas que as compreendam como “seres em desenvolvimento e pessoas-em-contextos” (Bronfenbrenner, 1996).

            Os recursos inexplorados das adversidades comuns entre super heróis no estágio “Pré-Cloak/Pre-Mask” e  as vidas das crianças em situações de risco, ou desfavorecidas, merecem considerações cautelosasda comunidade científica. Para muitos cientistas e profissionais de saúde, a noção de empregar-ícones ou ícones da cultura pop como os personagens dos quadrinhos, pode ser considerado um assunto pouco academico! Pode até parecer incongruente com ideais e rigores de investigação adequada. Porém, esta ideia não condiz com a realidade das crianças e adolescente e deve ser mais explorada cientificamente para gerar intervenções positivas e promotoras de saúde e desenvolvimento humano.

            Na verdade, as disparidades compartilhadas entre esses dois grupos (super heróis “Pré-Cloak/Pre-Mask”; crianças desfavorecidas em situações de risco) podem ser a chave para o empoderamento destas crianças que vivem essa multiplicidade de sofrimentos. Entretanto, as reflexões indicam que ainda há muita investigação futura  a ser realizada antes de qualquer constatação precipitada.

 

           

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