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O valor do primeiro Superman

Por Arthur Lopes Filho


Pode parecer coisa de quem está ficando velho, mas ainda guardo um certo saudosismo quando volto a ler HQs que fizeram parte da minha formação, mesmo que muitas delas sejam originárias de tempos dantes de meu nascimento, mas quando faço isso, sempre me recordo de qual foi minha recepção e o esforço que fazia em tentar entender o seu contexto de produção, pois muitas dessas histórias conversavam com situações que precisavam ser contextualizadas, mas que, para a época, eram evidentes. E isso me despertou esse espírito investigativo que cultivo até hoje.


Esse foi o caso de quando li a primeira história do Superman, publicada originalmente na revista Action Comics #1, nos EUA, em junho de 1938. É claro que a edição que tive acesso foi uma republicação que, se bem me recordo, veio em anexo a edição brasileira da morte do Superman, lá na década de 1990.

Me recordo que ao ler sua primeira aventura, eu guardava aquele espírito julgador de um adolescente dos anos 1990, olhando a velharia do passado, e dizia pra mim mesmo: “Puxa, como as coisas melhoraram, hoje o Superman é bem mais poderoso, as revistas são bem melhor desenhadas, as histórias são bem melhor construídas, como é que isso fez tanto sucesso”?

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Pois bem, é ai que o contexto dos EUA da década de 1930 acaba sendo (indiretamente) representado. No ano de 1929, os EUA sofreu diretamente o impacto de uma das maiores crises econômicas que afligiu o século XX: a quebra da bolsa de New York. Pessoas viram seus investimentos perderem valor de mercado, empresas tiveram de demitir funcionários, bancos simplesmente quebraram e fecharam contas de milhares de acionistas e a pobreza se disseminou em larga escala. Com isso, meios escusos de se ganhar a vida acabaram se popularizando, como o tráfego de mercadoria ilegal, roubo, assaltos e a atuação de carteis, como é o caso dos gangsters (que se popularizavam nessa época); por outro lado, as leis se tornaram mais rígidas, agindo com grande força coercitiva contra a ilegalidade, algo como uma espécie de política de repressão para fins de salvaguardar uma ideia de que, mesmo em meio à crise, a população deve fazer o que é certo: estudar e trabalhar (mesmo que, na prática, a crise não trazia boas expectativas para quem investisse em fazer a “coisa certa”).

Mesmo quase uma década depois da quebra da bolsa e após muitas medidas governamentais, os EUA ainda engatinhava em sair de um cenário de crise econômica. Aquela que outrora fora uma grande potência econômica, ainda cultivava muitas críticas, por parte de sua população, contra a política, as leis e a ação policial, além de ter, em muitos dos gangsters que ainda atuavam no país, figuras populares, vistas como pessoas não tão más, pois muitos deles “cuidavam” de suas comunidades, trazendo oportunidades de um real melhora na qualidade de vida, que o governo (ainda) não proporcionava. Sem mencionar que, ao longo dessa data, a Europa já estava tendo de lidar com a ascensão do partido nazista e a materialização de uma nova guerra de proporções mundiais, fazendo que, constantemente, a população estadunidense se visse ameaçada em ter de pegar em armas.

 

É em meio a esse fervor que a figura do Superman surge, não somente como um super-humano dotado de habilidades superiores, mas como a encarnação de um espírito que anseia por mudanças; alguém que é movido por uma espécie de super-ética e que se dispõe a lutar por ela. Seus valores são demonstrados ao longo da sua primeira história, onde ele não enfrenta grandes vilões, mas homens que agridem mulheres, ladrões e os entraves de um (falho) sistema judiciário que iria executar um inocente. Nesse sentido, o Superman se manifestaria como um símbolo de um vasto conjunto de valores de um EUA que se encontrava em tensão; valores que permeavam os anseios de toda uma nação: um senso de justiça, não só em combater o crime, mas em buscar, por meio de suas ações, mudar o cenário da injustiça que atingia toda nação.

 

Por isso, para mim, a primeira história do Superman traz algo que marcou as muitas gerações posteriores de super-heróis e que não tem a ver com os super-poderes que ele possuí: um senso de responsabilidade que nos leva a agir, sempre que diante da manifestação de uma injustiça e para isso, não precisamos ser um Superman (ou mesmo uma Supergirl).

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ARTUR RODRIGO ITAQUI LOPES FILHO
Master in Philosophy and History
Doctoral Student in History
Professor of Philosophy, History and Pop Culture
2 anexos
 
 

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